Foi enviado à OAB o requerimento abaixo, para que a entidade proponha Ação Direta de Inconstitucionalidade contra os comitês de controle da imprensa já instalados no Ceará e em Alagoas, como também contra a absurda proposta de eleição indireta para Presidente da República, caso o cargo fique vaga a menos de dois anos do fim do mandato.
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Se esta instituição tem algum apreço pela democracia, suplico que o demonstre com mais firmeza.
Inúmeras inconstitucionalidades estão em andamento e outras tantas encontram-se a caminho. Mas duas delas são absurdamente escandalosas, tão abomináveis que me causa espanto que esta OAB ainda não tenha ajuizado as competentes ADIN´s, o que desde já suplico seja feito, o quanto antes. Não se quer ensinar estes nobre doutos lições de direito constitucional, razão pela qual o que se segue é, antes de tudo, um singelo lembrete do óbvio, tão massacrado ultimamente pelos desvarios do poder e da corrupção.
Uma dessas inconstitucionalidades é a criação dos comitês estaduais de controle da imprensa, cujos nomes variam, mas ao fundo tratam sempre da mesma coisa. A outra é a proposta de eleição indireta para Presidente da República, caso o cargo fique vago a menos de dois anos do fim do mandato, o que consta da PEC 32/06, recém aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal.
Ambas as barbaridades têm assinatura tanto do governo, quanto da oposição: o desapego à Constituição Federal e à democracia é pluripartidário. Não basta a OAB emitir notas à imprensa, não quando tem o fantástico privilégio de propor Ação Direta de Inconstitucionalidade. Um privilégio que neste caso, em termos morais, se torna um verdadeiro dever.
Os comitês estaduais de controle da imprensa, pouco importando seus pomposos nomes regionais, são todos inconstitucionais. O Estado do Ceará já implementou o seu e outros estão com o projeto devidamente encaminhado: Piauí, Bahia e São Paulo. Em Alagoas já há um de caráter consultivo, mas que poderá se tornar deliberativo, se aprovado o projeto de lei encaminhado à Assembléia Legislativa local.
Estes comitês invadem competência privativa da União e ainda ferem o Principio Republicano, ainda que de modo inverso, ou seja, ao contrário do que normalmente é visto em nossa histórica recente. Usualmente é a União quem se sobrepõe aos entes federados e rouba-lhes competência e receitas. Desta vez, foi o inverso, os Estados é que o ferem, ao pretender fiscalizar o executivo federal. Pior, ainda roubaram a competência privativa da União de legislar sobre telecomunicações e tele-radiodifusão. O artigo 22 da Constituição Federal é bastante claro:
Compete privativamente à União legislar sobre :
IV – águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão;
Por seu turno, o artigo 220 da CF determina que não haverá lei que restrinja a expressão e a informação sob qualquer forma. Também estabelece que não a lei não poderá conter nenhum embaraço à liberdade de informação e veda toda e qualquer forma de censura estatal, ainda que a meramente opinativa.
Se apenas a União pode legislar, isto implica que a matéria é de todo de responsabilidade dela. Não há espaço na norma constitucional para delegação, muito menos para legislar. Pior, nada há na Constituição que permita que o Poder Legislativo Estadual fiscalize o Poder Executivo Federal. Se a União, eventualmente, não cumpre seu papel de regrar e fiscalizar as normas atinentes à telecomunicação, não podem os legislativos estaduais fiscalizarem esta atuação ou omissão da União. Só o Congresso Nacional pode fiscalizar o executivo federal. É aí que reside a inversão do pacto federativo, ao arrogar-se o papel de fiscais de matérias federais, as Assembléias Legislativas ignoram o Princípio Federativo, o que torna todas as suas ações inconstitucionais.
Portanto, quanto aos comitês de controle da imprensa temos já duas inconstitucionalidades: invasão de competência e ofensa ao Princípio Republicano.
Quanto à absurda proposta de eleição indireta para Presidente da República, esta sandice acabou passando pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a qual talvez entenda de justiça, mas certamente não de Constituição. O artigo 60, parágrafo 4º é cristalino:
Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
II – o voto direto, secreto, universal e periódico
Talvez seja discutível que uma ADIN possa obter um provimento do STF que interfira no processo legislativo, mas há aí um absurdo crime contra o devido processo legal. Se há um regimento que impõe que seja feita uma análise da constitucionalidade dos projetos de lei e esta faz pouco caso da letra expressa da Constituição, obviamente não houve análise alguma e, portanto, o projeto não poderia seguir a plenário.
O simples fato de uma temeridade destas ter sido cogitada já é mais que suficiente para a OAB agir. Essa PEC 32/06 é uma atrocidade aos valores democráticos, à soberania popular e a diversos dispositivos constitucionais, a saber, artigo 60, par. 4º, II; artigo 1º, parágrafo único; artigo 14, entre outros e seus princípios vários.
Ora, a CCJ descumpriu também o artigo 58, parágrafo 2º, da CF, que determina que as Comissões do Congresso devem, em razão da matéria, realizar audiências públicas com entidades da sociedade civil, o que não foi feito.
Caso Vossas Senhorias entendam que não cabe, ainda, uma ADIN contra essa PEC imoral e anti-democrática, que ao menos a OAB oficie os senhores congressistas sobre a inconstitucionalidade dessa sandice, para que, quem sabe, esta atitude os ilumine, visto que a CCJ foi, para dizer o mínimo, vergonhosamente omissa na questão. Este ofício deve ser encaminhado com fundamento no artigo 58, IV da CF, o que obrigará a CCJ a se manifestar expressamente sobre a questão.
Senhores Conselheiros, por muito menos que isso, por muito e muito menos, o exército Hondurenho se viu obrigado a agir para fazer valer a Constituição local. Por muito e muito menos do que isso, o Brasil viu tanques de guerra nas ruas em 1964. A OAB tem o poder e o dever de evitar que se chegue a tal ponto, ou, sabe-se lá o que seja pior, que nada feito.
Diante disto, respeitosamente requeiro que esta este Conselho Federal da OAB, com fundamento no artigo 103, VII da CF, e nos artigos 44, I, e 51, XIV, da lei 8906/94, proponha as competentes ADIN´s em face das leis estaduais que criaram os comitês estaduais de controle da imprensa no Ceará e em Alagoas; e ainda contra a tramitação da PEC 32/06, por vício no devido processo legal, ou, alternativamente, se oficie, com fundamento no artigo 58, IV da CF, os senhores congressistas a respeito da indiscutível inconstitucionalidade da proposta de eleição indireta para Presidente da República.
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Agora é torcer para que a entidade use de seu fabuloso privilégio de poder propor ADIN´s e que o STF faça valer a Constituição. Se não der certo, que nos resta? O Aeroporto? As armas?