A IMPORTÂNCIA DA BAIXARIA

20 outubro, 2010


Dilma é o satanás de Goiás virado do avesso benzutado em amônia e ácido sulfúrico. Todo mundo sabe. Até quem vota nela sabe, mas como é Lula que apóia, nego nem liga, acha que a santidade dele protegerá todo mundo. Mas chega dela. Agora é Serra. O bunda mole. Ou pelo menos, campanha bunda mole. Imagine o seguinte: sai um filme chamado As Calcinhas Desvairadas. No elenco, Angelina Jolie, Charlize Theron, Scarlett Johanson, Naomi Watts, Nicole Kidman e Megan Fox. No cartaz se lê: Amor, Sexo, Traição E Tudo Que Há Entre Eles. A crítica diz que é das melhores coisas jamais feitas e escreve: cenas fortes, momentos tensos, sensualidade explosiva. Aí vai você, pessoa humana nascida do sexo masculino que se sente do sexo masculino, ao cinema. E não vê nada de nudez. Nem de calcinhas. É isto. É isto a campanha de José Serra. Um farto material para deixar todos os petistas loucos de raiva e, necas, só água com açúcar e assuntos requentados.

Sejamos francos. Sem sangue não vale a pena campanha alguma. Propostas são importantes e coisa e tal, mas, ei, do que estamos falando aqui? Da presidência de um clube do livro num condomínio classe média? Não, cacete, não. Se trata de dar a um dos candidatos um poder de proporções divinas e o controle prático de um orçamento de centenas de bilhões de reais anuais. Só para dar uma palhinha bem leve do que seja a presidência, o seu titular pode, sem ofender a lei, eventualmente a moral, e sem ter de dar explicações a ninguém, ninguém, ninguém, mandar para fora do país, quando bem entender, praticamente qualquer estrangeiro que esteja em solo pátrio, à exceção de diplomatas (e olhe lá). E ainda temos as medidas provisórias. Se o Presidente editar uma MP revogando todo o Código Penal, ela valerá até que o Congresso decida derruba-la e se isto ocorrer em dois dias que seja, todos os crimes cometidos no país nesses dois dias não serão punidos pela simples razão de não serem crimes. E só quem pode propor a lei do orçamento federal é o Presidente. E legalmente a execução do orçamento é tarefa sua. E existe um dispositivo constitucional chamado por aí de contingenciamento que dá a ele o poder de aplicar essa lei do jeito que bem entenda, podendo ignora-la numa miríade de circunstâncias. Tá entendo? O bagulho é louco. Louco, louco, louco.

Registre-se, de novo, a importância de propostas e da discussão séria, clara e honesta de temas os mais variados. Ok, registrado está.

Mas a quem se dá um poder desses? Em quem confiar para ter na mão uma caneta capaz de fazer a vida de qualquer pessoa um inferno na Terra? Diante desse quadro, do titânico poder que tem um presidente neste país, o que têm aparecido na imprensa e na internet em geral é fichinha. Tudo conta, tudo é importante nessa escolha, cada detalhe de vida, cada mínimo indício de desvio de personalidade ou conduta, cada sombra esquiva, cada sorriso mal explicado, cada peido fora de hora, a supor que haja hora para isso. Tudo é importante. Tudo. Aquela cadeira em Brasília transforma um reles mortal num semi-deus. Tudo importa, tudo conta e tudo deve ser mostrado, incluindo, sim, claro, se o candidato tem ou não o costume de lavar as mãos após sair do banheiro.

E vão pro inferno os defensores de um tal de “debate limpo”. Isso é coisa para discussão meramente acadêmica. O futuro de um país está infinitamente acima disto. Esse poder todo não pode ser colocado nas mãos de desconhecidos. O que quer que se saiba do candidato, pode e deve ser publicado e comentado, ainda que, eventualmente, nem haja lá muito como provar o dito, basta não fechar o espaço ao interessado para ele dar a sua versão. Azar de quem entrou na arena, ninguém obrigou. Deram a cara a tapa livremente. É muita desfaçatez neguinho achar que vai governar quase 200 milhões de pessoas sem querer ouvir uma meia dúzia de ofensas. Políticos, nesse desiderato, são como as tais celebridades: adoram a fama, mas quando a conta chega, choram e partem para a censura. Essa gente não cresce nunca? Outro dia, um maluco fotógrafo conseguiu achar uma, notem bem, uma, uma estria no corpo da Shakira. A descoberta rodou o mundo. Ela não deve ter gostado, mas e daí? É verdade e a mesma imprensa que publicou isto, publicou tantas outras informações que a ajudaram a vender milhões de discos e mais ou menos dez vezes isso em ingressos. Pra ajudar a faturar pode publicar, mas para mostrar um pouco mais do que ela mesmo mostra o tempo todo para as câmeras não pode? Ah, dá um tempo vai. E com políticos a coisa é ainda pior, porque eles não apenas faturam com a exposição, eles ganham poder. Muito poder. Por isto devem ser seguidos dia e noite, incessantemente por qualquer cidadão interessado. Mesmo porque são funcionários públicos em tempo integral, eles não têm horário de expediente. Lula é presidente o tempo todo, onde quer que esteja, o que, anotem petistas espumantes, torna todas as críticas às suas viagens Brasil e mundo afora uma arrematada bobagem (participação em campanha é outro papo).

E o que a campanha do candidato Serra tem mostrado a respeito de Dilma Vana Roussef? Quase nada. A coisa tava feia pro lado dele no primeiro turno. Foi uma, digamos, baixaria, que o colocou em pé no ringue novamente: a polêmica do aborto. Nada errado, jogo jogado, a questão é relevante para uma baita parcela do eleitorado, tanto assim que a própria prejudicada saiu correndo desmentir a si mesma, afirmando o contrário do que já afirmara antes, que vem a ser também o contrário do que seu fabricante disse no passado, que também vem a ser o contrário do que o seu partido prega, escreve e assina, que vem a ser também o contrário do que está mandado pelo presidente petista naquele decreto absurdo apelidado de Plano Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH3).

Bem, se a tal da baixaria o ajudou, então por que não continuar? Vejam bem: problema é se o camarada inventar algo falso. Aí dá para descer o cacete no candidato calunioso, mas se é fato, se há uma tênue ligação que seja entre o adversário e algo que não cheira bem, expor isso é um verdadeiro dever cívico de todos os candidatos. Ocultar em nome de um tal de “debate limpo” é colocar a própria vaidade acima dos interesses dos eleitores. Quem decide o que faz ou não diferença para escolher ou não esse ou aquele Mané que se candidata é o eleitor, os critérios são dele e ninguém tem nada que ver com isso. Ora, aborto, drogas e time de futebol são critérios tão bons quanto quaisquer outros, a liberdade do voto não tem condicionantes ideológicos, ora bolas. Por exemplo, um bom tanto da população adota sem o menor pudor a idéia malufista de “rouba, mas faz”. Ou por acaso tá todo mundo acreditando que o PT é uma filial do céu? Parte expressiva do populacho sabe da roubalheira, só não liga, porque acredita que, apesar disto, o partido lhe fez mais bem do que mal. Mas, voltemos.

Baixaria, sendo isto mostrar de tudo, até o jeito de o candidato sentar na privada, não tem nada demais. Poder absurdo, lembram? A quem vai? Poder absurdo, fiscalização absurda, inclusive e especialmente prévia. Ninguém é obrigado a assumir tal poder, mas se quiser, obviamente há de pagar o preço. E tem de ser caro, absurdamente caro.

Só que a campanha de Serra tem mostrado muito menos do que já é público e notório. O passado terrorista de Dilma Roussef não é negado nem por ela. O youtube está cheio de vídeos que a mostram orgulhosa de ter pego em armas e participado de assaltos, seqüestros e etc. A revista Piauí, que está uns 100 anos luz de vir a ser um antro direitista, publicou uma matéria enorme sobre sua vida e lá tem muita coisa a respeito de armas, assaltos, seqüestros e tudo o mais. Páginas e páginas. E a candidata não deu um pio sequer contra a publicação, bem ao contrário do que vem fazendo com meia dúzia de padres que pedem aos fiéis que não votem em quem apóia o aborto (mas se ela é contra, qual o problema?).

O mesmo youtube mostra um companheiro de governo de Dilma, Franklin Martins, fazendo narrativas interessantes sobre isso de pegar em armas, seqüestros e tudo o mais. E eles foram namorados nesse tempo aí. Nem isso os tucanos falam, caramba.

Nem vamos esperar que eles falem do Foro de São Paulo, a grande reunião de comunas para implantar um governo continental de esquerda na América Latina. Até porque o PSDB tem lá suas ligações ideológicas com coisas desse naipe, qualquer dúvida perguntem ao FHC e seus Elders. Ok, isso dá para entender. Nem esperemos nada nesse sentido.

Mas e o resto? A personalidade da cidadã, bem, digamos que faz o Dunga ser mais gente fina que o Romário.

O PSDB não se dá nem ao trabalho de desmentir Lula em coisas básicas. Lula agradeceu ao governador tucano Marconi Perillo pela invenção do Bolsa Família. A coisa foi registrada em vídeo: https://domaugostodamateria.wordpress.com/2010/10/16/lula-reconhece-paternidade-do-bolsa-familia/. Nunca passou no horário tucano de campanha. Nunca. Ora bolas, é a grande vedete do PT, que a roubou. Roubem de volta, sabe como é, cem anos de perdão. Até porque é só uma retomada.

E o PT não assinou a Constituição de 1988. Não concorda com nada do que está escrito ali, inclusive um sem número de direitos trabalhistas. Como assim um Partido dos Trabalhadores que não apóia direitos trabalhistas?

O PT falou ad nauseaum que o Plano Real iria fracassar. Ou então quebrar o país. Ou então era só eleitoreiro. Ou então tudo isso e mais um pouco de coisa ruim. E no fim deram-lhe continuidade. Quanto isto foi realmente explorado?

E que tanto o PT se apóia em programas assistenciais? Fora 2002, em todas as campanhas sempre se posicionou contra, dizendo que era um meio de manter o povo pobre eternamente dependente do governo. Não foi mostrado essa posição firme do PT a respeito do tema.

A campanha tucana não mostra nem que o próprio Lula considera a sua candidata uma boneca, um muppet. Também está registrado em vídeo: https://domaugostodamateria.wordpress.com/2010/10/17/lula-explica-o-candidato-e-ele/

Se não são uma meia dúzia de jornalistas, uns milhares de blogueiros e uns sabe-se lá quantos milhares de eleitores disparando no twitter feito doidos, essas coisas mal seriam lembradas. Ora, os eleitores de Serra sabem disso tudo. Por que não mostrar ao grande público, aos eleitores de Dilma?

Os especialistas, comentaristas, colunistas e outros istas estão errados, muito errados: a campanha não está aguerrida, sangrenta, está mole demais considerando-se o que está em jogo. A história mostra que a subida aos Olimpos da vida não é coisa fácil para ninguém e não há nenhuma razão para que seja diferente com a presidência do Brasil. A campanha de José Serra é bunda mole e pode colocar o Brasil em mãos com interesses nada democráticos, para dizer o mínimo. O mínimo.